PROPOSTA
Objeto
Os games foram considerados, por muito tempo, instrumento de diversão para crianças e adultos, limitados a um círculo restrito de pessoas e marginalizados em relação a outros conteúdos audiovisuais. Atualmente, essa indústria atinge números muito mais expressivos que a cinematográfica, tanto em arrecadação como em lucratividade; além disso, os games tornaram-se objeto de estudo devido a sua capacidade imersiva e interativa, resultando em dissertações e artigos que estudam a convergência de mídias e sua construção narrativa.
Apoiando-se no panorama acima, este documentário estuda a relação estética e de linguagem entre games e cinema, que se estreita cada vez mais principalmente pelo desenvolvimento das histórias e personagens. Essa integração proporciona uma nova dimensão à sétima arte, conferindo maior interatividade e atenuando a passividade do espectador, enquanto os games desenvolvem tramas intrincadas com elevada carga dramática, valorizadas pelas cutscenes cinematográficas que permeiam a jogabilidade.
Tal processo, conforme consta na bibliografia de Jay David Bolter e Richard Grusin, denomina-se remediation (termo inexistente na língua portuguesa que indica remidiação, no qual o conteúdo de uma mídia sempre é outra mídia, referindo-se não apenas à mudança estrutural do conteúdo, mas a uma inter-relação e incorporação de mídias num mesmo material). Apesar dessa multiplicação de mídias e de tecnologias de mediação, existe o objetivo de apagar os seus traços, tornando-a implícita. Esse processo de apropriação pode ocorrer em ambas as direções, tanto pela forma dos games estruturarem narrativas e pontos de vista, como pela necessidade do cinema em desenvolver recursos digitais e promover maior envolvimento do público.
Justamente por isso o filme recebe o nome de Kino-Igra, associando as palavras cinema e games em russo, uma referência à história do documentário e os conceitos de Kino-Pravda e Kino-Glaz. Nesta nova conceituação, permanecem as discussões sobre estética e reprodução mimética da aparência imediata, porém num patamar de equivalência entre as mídias, no qual discute-se semelhanças no processo produtivo e criativo, e seu consequente resultado final diante o público.
Apoiando-se no panorama acima, este documentário estuda a relação estética e de linguagem entre games e cinema, que se estreita cada vez mais principalmente pelo desenvolvimento das histórias e personagens. Essa integração proporciona uma nova dimensão à sétima arte, conferindo maior interatividade e atenuando a passividade do espectador, enquanto os games desenvolvem tramas intrincadas com elevada carga dramática, valorizadas pelas cutscenes cinematográficas que permeiam a jogabilidade.
Tal processo, conforme consta na bibliografia de Jay David Bolter e Richard Grusin, denomina-se remediation (termo inexistente na língua portuguesa que indica remidiação, no qual o conteúdo de uma mídia sempre é outra mídia, referindo-se não apenas à mudança estrutural do conteúdo, mas a uma inter-relação e incorporação de mídias num mesmo material). Apesar dessa multiplicação de mídias e de tecnologias de mediação, existe o objetivo de apagar os seus traços, tornando-a implícita. Esse processo de apropriação pode ocorrer em ambas as direções, tanto pela forma dos games estruturarem narrativas e pontos de vista, como pela necessidade do cinema em desenvolver recursos digitais e promover maior envolvimento do público.
Justamente por isso o filme recebe o nome de Kino-Igra, associando as palavras cinema e games em russo, uma referência à história do documentário e os conceitos de Kino-Pravda e Kino-Glaz. Nesta nova conceituação, permanecem as discussões sobre estética e reprodução mimética da aparência imediata, porém num patamar de equivalência entre as mídias, no qual discute-se semelhanças no processo produtivo e criativo, e seu consequente resultado final diante o público.
Estratégia de Abordagem
O documentário tem prioritariamente uma abordagem expositiva e participativa, no intuito de proporcionar aos espectadores maior conhecimento sobre o tema; por isso prioriza-se a informação, passada de maneira mais didática com base em dados quantitativos e qualitativos, assim como pelas entrevistas com profissionais e estudiosos das áreas em questão. Obviamente, em determinados momentos podem prevalecer características de outros tipos de documentário, principalmente nas imagens de preenchimento que observam as pessoas jogando ou exercendo tarefas de programação.
Detalhando a abordagem expositiva, esta ocorre principalmente para explicar os conceitos de remediation, um processo que é fundamental para o propósito do filme; em certos momentos é preciso ser mais didático para demonstrar embasamento teórico e científico sobre o tema, evidenciando que isso vai muito além de uma simples aproximação entre cinema e jogos digitais. O uso de voice-over enriquece esse processo, ao mesmo tempo em que imagens de gamers e dos jogos corroboram com as informações transmitidas, favorecendo o dinamismo da informação.
Em relação à abordagem participativa, algumas entrevistas estabelecidas previamente pretendem explorar o tema através dos convidados. Profissionais da área de cinema e de games discorrem sobre o assunto de modo teórico e acadêmico, embasando o documentário cientificamente. Esse é um ponto a ser reiterado pois trata-se do principal objetivo do filme, mostrar que existe uma convergência estrutural e narrativa, um método de linguagem que não pode ser inferiorizado por se associar à diversão. Além disso, alunos do curso de Design de Games também são questionados a respeito, para exporem suas opiniões como futuros profissionais e como cinéfilos/gamers.
Da maneira como se constroem as entrevistas, o espectador percebe uma diferenciação de personagens que conduz mais assertivamente o filme. Enquanto os acadêmicos representam a autoridade no assunto, os estudantes promovem a intermediação entre o lado passional e profissional. A princípio, não se mostra necessária a intervenção do cineasta ou reconstrução ficcional dos fatos, visto que a inserção de trechos dos games já proporciona maior dinamismo ao filme e ainda ilustra aquilo que está sendo dito.
Estrutura
O documentário é estruturado prioritariamente com registros originais e material de arquivo, num processo de realização e montagem que favorece o ritmo e dinamismo das imagens, em consonância com a proposta em discussão. Por tratar-se de um estudo sobre convergência midiática, existe a preocupação em misturar imagens live-action e gameplay, justamente para romper algumas barreiras de percepção e desenvolver um trabalho de transmídia também na construção do curta-metragem. As imagens reais representam os registros originais, neste caso eventos integrados organizados exclusivamente para o filme; tratam-se de entrevistas e cenas de preenchimento que revelam a interação das pessoas com os jogos digitais, principalmente enquanto jogam ou desenvolvem sua obra, valorizando não somente a fala dos personagens, como também suas ações.
Em determinados momentos, sejam eles expositivos ou de entrevistas, ocorre a inserção de imagens de arquivo, representadas por pequenos trechos de games que se aproximam da estrutura cinematográfica em questão. Além disso, existe ainda o uso de recursos gráficos para complementar informações ou constituir a própria estrutura de linguagem do documentário; os recursos digitais são incorporados pela narrativa do filme, no intuito de estabelecer um produto transmídia que apresente detalhamento gráfico semelhante a um game.
Essa confluência imagética é o ponto-chave desta obra, que emula em sua construção o seu objeto de estudo; o material original é o representante do cinema, ao tempo em que o material de arquivo defende os games, num exercício de associação e alternância em cena para imersão do público, que ao término compreende tudo como um só produto. Além disso, a utilização de recursos gráficos transcende a proposta original e estabelece uma ponte entre o real e o virtual, num processo de fusão com elementos de ambas as naturezas. Nesse momento, as partes se anulam para constituir uma nova relação no espaço fílmico, onde os espectadores percebem o cruzamento de mídias a partir do momento em que elas são unificadas e se tornam uma só coisa.
Em aspectos sonoros, a produção é constituída de complexidade semelhante. O som direto está presente em todas as entrevistas realizadas, conferindo caráter de autenticidade e naturalidade aos depoimentos dos personagens. Já a voz over surge em momentos específicos, para elucidar alguns aspectos técnicos e teóricos, ou complementar relatos com dados estatísticos. Quanto aos efeitos sonoros, enfatizam o trabalho de montagem que alterna entre os depoimentos e as imagens de arquivo, e ainda remetem a algumas sonoridades semelhantes aos games, também num processo de transcrição de linguagem. Com relação à trilha sonora, ela surge em pontos específicos e pretende recriar a paisagem sonora comum aos jogos, inclusive na releitura de temas clássicos. Dessa maneira, o mesmo processo transmídia abordado e explorado nas imagens se estende aos sons, tornando a experiência cinematográfica completa.
Com relação às sequências de ações, inicialmente existe a preocupação em contextualizar o espectador sobre o tema. Assim, apresentam-se as semelhanças entre os games e o cinema, primeiramente nas etapas de produção e depois nos modos de desenvolvimento narrativo. A partir daí, quando o público se encontra integrado ao contexto, ocorre a inserção de alguns termos técnicos voltados para o processo de transmídia, que exigem maior didatismo e uma edição mais cadenciada. Quanto às locações, prioriza-se o espaço acadêmico, berço do estudo e da criatividade, para entrevistar profissionais e alunos, permitindo que estes permaneçam à vontade e transmitam maior naturalidade em seus relatos.
Relatório de Pesquisa
O mercado dos games tem mostrado um crescimento assombroso em comparação ao cinema nos últimos anos. Pesquisas apontam que em 2015 a indústria dos games arrecadou 110 bilhões de dólares, enquanto os filmes estacionaram na metade desse valor; prova de que muitas pessoas têm optado em investir seu tempo e dinheiro nos jogos digitais. As circunstâncias para isso são inúmeras, portanto não podem ser discutidas em poucos minutos, mas elas motivaram a pesquisa sobre o tema, direcionando a abordagem deste curta-metragem para as comparações possíveis entre os games e os filmes, considerando a semelhança narrativa, a estrutura de linguagem e as práticas profissionais.
O período para concretização de projetos dessa natureza dispende igualmente mão-de-obra, milhares de horas de trabalho e volumosas etapas de produção, resultando em anos da preparação até o produto final; filmes e games dificilmente escapam desses percalços. Ambos se constituem de etapas de preparação e pré-produção, que exigem o desenvolvimento de conceitos associados à fotografia, arte, som e direção, tanto em aspectos artísticos quanto na interatividade com o público. Nessas fases ainda ocorre a elaboração do roteiro, calcado na jornada do herói e estrutura do mito, que proporciona à trama principal e às missões secundárias um formato clássico que localiza o espectador independentemente da mídia. A partir daí, não somente o processo de construção é igual, como também o modo de interação com o produto final.
Logicamente, a etapa de produção e finalização também exigem o mesmo cuidado. Demandam tempo para execução do planejamento e acuidade técnica que promova fluidez ao conteúdo, visando sua comercialização mundial. Para isso, planejamento comercial e estratégias de marketing são cruciais, segmentadas conforme a região de atuação; cada vez mais os games recebem tratamento cinematográfico, com inúmeros trailers e eventos que remetem a uma produção hollywoodiana. Da mesma maneira, muitos filmes atrelam suas estreias ao lançamento de algum jogo digital ou plataforma virtual, método para expansão narrativa ou atração de público.
Atualmente, os próprios atores e cineastas tem participado diretamente no universo gamer, elaborando roteiros, dirigindo produções ou atuando com base na tecnologia de captura de movimentos. Spike Lee dirigiu o modo carreira de NBA 2K16; John Woo desenvolveu o game Stranglehold, sequência de seu filme Fervura Máxima (1992); Ellen Page emprestou suas feições em The Last of Us e Beyond: Two Souls; e Kiefer Sutherland empregou sua voz e movimentos em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain. Esses exemplos apenas reiteram a aproximação crescente entre as mídias, numa convergência cada vez mais complexa.
Convergência esta que é mais intrínseca e presente do que se imagina, conforme o conceito de remediation, já abordado anteriormente e constituído pela immediacy e hipermediacy, propostas de Jay David Bolter e Richard Grusin. A primeira manifesta o intuito de mostrar a realidade como ela é ao esconder as marcas de sua captação, conferindo efeito de imediaticidade do evento captado e uma sensação de presença no espaço da representação artística. Já a segunda preocupa-se em criar o máximo de simultaneidade e informações ao espectador, tornando consciente a mediação ativa, principalmente através da percepção do processo no qual um meio aproveita recursos do outro.
Embora pareça contraditório, a impressão de immediacy criada nos games é gerada em grande parte pelas expectativas dos jogadores vindas do filme como uma mídia. O senso de presença pode ser definido em termos de habitar ou explorar cenários digitalmente produzidos que evocam características
cinematográficas, bem como a liberdade de mover-se dentro de um mundo ficcional no qual o gamer é figura central, envolvido em todos os tipos de experiências cinemáticas oferecidas num longa-metragem. Assim como num filme, há a sensação momentânea de estar totalmente presente naquela realidade, sem a percepção da interface ou da tecnologia. Logo, o processo transmídia assume elevada naturalidade e consciência de si próprio, em uma dinâmica que desperta estudos acadêmicos e a troca entre as partes envolvidas.
O período para concretização de projetos dessa natureza dispende igualmente mão-de-obra, milhares de horas de trabalho e volumosas etapas de produção, resultando em anos da preparação até o produto final; filmes e games dificilmente escapam desses percalços. Ambos se constituem de etapas de preparação e pré-produção, que exigem o desenvolvimento de conceitos associados à fotografia, arte, som e direção, tanto em aspectos artísticos quanto na interatividade com o público. Nessas fases ainda ocorre a elaboração do roteiro, calcado na jornada do herói e estrutura do mito, que proporciona à trama principal e às missões secundárias um formato clássico que localiza o espectador independentemente da mídia. A partir daí, não somente o processo de construção é igual, como também o modo de interação com o produto final.
Logicamente, a etapa de produção e finalização também exigem o mesmo cuidado. Demandam tempo para execução do planejamento e acuidade técnica que promova fluidez ao conteúdo, visando sua comercialização mundial. Para isso, planejamento comercial e estratégias de marketing são cruciais, segmentadas conforme a região de atuação; cada vez mais os games recebem tratamento cinematográfico, com inúmeros trailers e eventos que remetem a uma produção hollywoodiana. Da mesma maneira, muitos filmes atrelam suas estreias ao lançamento de algum jogo digital ou plataforma virtual, método para expansão narrativa ou atração de público.
Atualmente, os próprios atores e cineastas tem participado diretamente no universo gamer, elaborando roteiros, dirigindo produções ou atuando com base na tecnologia de captura de movimentos. Spike Lee dirigiu o modo carreira de NBA 2K16; John Woo desenvolveu o game Stranglehold, sequência de seu filme Fervura Máxima (1992); Ellen Page emprestou suas feições em The Last of Us e Beyond: Two Souls; e Kiefer Sutherland empregou sua voz e movimentos em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain. Esses exemplos apenas reiteram a aproximação crescente entre as mídias, numa convergência cada vez mais complexa.
Convergência esta que é mais intrínseca e presente do que se imagina, conforme o conceito de remediation, já abordado anteriormente e constituído pela immediacy e hipermediacy, propostas de Jay David Bolter e Richard Grusin. A primeira manifesta o intuito de mostrar a realidade como ela é ao esconder as marcas de sua captação, conferindo efeito de imediaticidade do evento captado e uma sensação de presença no espaço da representação artística. Já a segunda preocupa-se em criar o máximo de simultaneidade e informações ao espectador, tornando consciente a mediação ativa, principalmente através da percepção do processo no qual um meio aproveita recursos do outro.
Embora pareça contraditório, a impressão de immediacy criada nos games é gerada em grande parte pelas expectativas dos jogadores vindas do filme como uma mídia. O senso de presença pode ser definido em termos de habitar ou explorar cenários digitalmente produzidos que evocam características
cinematográficas, bem como a liberdade de mover-se dentro de um mundo ficcional no qual o gamer é figura central, envolvido em todos os tipos de experiências cinemáticas oferecidas num longa-metragem. Assim como num filme, há a sensação momentânea de estar totalmente presente naquela realidade, sem a percepção da interface ou da tecnologia. Logo, o processo transmídia assume elevada naturalidade e consciência de si próprio, em uma dinâmica que desperta estudos acadêmicos e a troca entre as partes envolvidas.